Tem sido objeto de bastante controvérsia a recente evolução política na Região Autónoma dos Açores e as suas ilações nacionais.
A aliança formalizada entre o PSD e o partido neofascista é, democraticamente, execrável. Sabemos que mesmo grande parte do Partido Popular Europeu, que o PSD integra, rejeita tal tipo de alianças mas, em Portugal, só se deve admirar quem desconheça a génese e a natureza da direita lusa.
PSD, CDS, Chega e afins são filhos do mesmo capitalismo incompetente que, durante décadas, vegetou à sombra da União Nacional/ANP e sempre aplaudiu a repressão contra os trabalhadores e as suas organizações. As 'inquietações' democráticas só sobrevieram a alguns desses quando o fim do fascismo já era uma evidência ou, sobretudo, quando a revolução de Abril libertou a capacidade de intervenção de todos os portugueses.
As lideranças da direita (obviamente que a maioria do seu eleitorado não tem essa compreensão) não diferem ideologicamente do salazarmarcelismo, apenas se têm procurado adequar, a contragosto, ao 'jogo' democrático para defesa dos seus interesses. Há exceções, mas são apenas isso, exceções que ocasionalmente interessam à direita económica mas que nunca tiveram efetivo poder como, por exemplo, o percurso de Freitas do Amaral bem ilustrou.
A contribuição agora dada pela direita dita 'democrática' para promover o neofascismo merece repulsa e deve ser combatida.
Mas ficamos por aqui?
A "lição dos Açores" restringe-se à crítica à direita? A esquerda não deve refletir autocriticamente sobre o que levou a este desenlace?
O PS, depois de uma prolongada governação, deu lugar a um Parlamento com a esquerda em minoria. Porquê?
Invocar a 'alternância democrática' ou o 'desgaste do poder' é escusa simplista que, mais não fosse, nem resistiria à comparação com a outra Região Autónoma.
Carlos César, primeiro, e Vasco Codeiro, depois, nunca quiseram corporizar uma verdadeira alternativa à governação da direita. A sua opção 'centrista' esteve sempre mais apostada numa 'evolução na continuidade', mantendo no essencial o mesmo rumo de Mota Amaral, sem significativas mudanças.
A precariedade, o cerceamento de direitos, a desigualdade e o caciquismo foram presenças constantes nos vinte anos de gestão PS nos Açores. É verdade que houve alguns progressos neste período mas mais do que retirar à direita económica os seus instrumentos de dominação o PS apostou em enfraquecer os Partidos à sua esquerda e em fragilizar as organizações locais dos trabalhadores.
Os factos açorianos ilustram as consequências de uma opção "socialista" que sonha com a 'alternância' e rejeita uma real alternativa. Um PS que se compraz em enfraquecer à sua esquerda e em teatralizar uma ilusória conflitualidade com a sua direita. Um PS que ainda vive na ambição de um bipartidarismo que possa garantir a tranquilidade do bloco central de interesses.
Não há como iludir que a atual emergência pública do neofascismo é também uma consequência da orientação 'centrista' que tem prevalecido no PS Açores.
Todos aqueles que se regozijam quando veem o PCP ou o BE a perder votos, todos quantos denigrem a organização autónoma dos trabalhadores, todos quantos apostam na divisão e no enfraquecimento dos sindicatos, todos quantos querem o PS como um mero clube de eleitores prisioneiro do pântano centrista deveriam aproveitar para refletir.
É também com essas
opções que se alimenta o ascenso do fascismo.
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