A comunicação social mente: o exemplo da Bolívia

 


As informações mentirosas (as célebres fake news) não são uma novidade nem são uma originalidade das redes digitais (facebook, tweet, etc). Estas tornaram-se sobretudo um veículo de ampliação e banalização de uma prática que há muito é exercida na comunicação social com uma perícia crescentemente sofisticada.

A comunicação social, com honrosas exceções, mente quotidianamente. Fá-lo  recorrendo a uma pseudoimparcialidade enganosa e com técnicas especializadas nomeadamente o jogar com a pouca memória do público.

 

Manuel Carvalho, diretor do jornal 'Público' é um comentarista e opinólogo que se desdobra por vários órgãos de comunicação designadamente na RTP.  Certamente não é dos piores jornalistas mas é um profissional da manipulação e um prestador de  'serviços específicos' em conformidade com a ideologia dos seus patrões da SONAE.

 

Há um ano foi dos primeiros a branquear o golpe na Bolívia. Do alto da sua 'informação privilegiada' cuidou de fazer passar como óbvio que a vitória  do Movimento para o Socialismo - Instrumento Político para a Soberania dos Povos  (MAS)  era «uma 'chapelada', uma fraude em larga escala» e por isso «Evo Morales tem que sair».

 


 

Nessa ocasião escrevi que «Manuel Carvalho mente, serve ao público a narrativa que lhe encomendaram para justificar o golpe».

 

Passou apenas um ano.

Sob ocupação de um regime proto-fascista, a que não faltou a violência e a  perseguição, realizaram-se novas eleições tendentes a naturalizar o golpe e a validar os golpistas. E, todavia, perderam porque o povo boliviano voltou a dar uma larga maioria ao MAS e elegeu como presidente o seu candidato, Luis Arce.

Evo Morales regressou finalmente à sua pátria e os golpistas, ainda que entretanto tenham tentado assassinar o presidente eleito, parecem estar a digerir a derrota.

 


 

 

Neste quadro o que faz a comunicação social hegemónica? O que nos diz agora o prolixo Manuel Carvalho ?

Reconhecem o erro? Autocriticam as suas análise e as parangonas com que há um ano bombardearam a opinião pública?

Não! Limitam-se a assobiar para o ar e seguem em frente reduzindo ao mínimo a informação sobre o que agora se está a passar na Bolívia.

Mentiram descaradamente ao serviço dos poderes dominantes e se os factos contradizem as suas 'sabedorias' limitam-se a ignorá-los.

É assim a 'nossa' comunicação social. Recebem largos subsídios e apoios públicos, autopublicitam-se como arautos do rigor e da verdade, constituem-se como polícias das 'fakes news' mas de facto não são mais do que porta-vozes da oligarquia de um sistema corrupto e decrépito.

Pode parecer violento apodar  estes ilustres e mediáticos 'opinion makers' como meros charlatões, serviçais, manipuladores e mentirosos. Mas é o que eles são e, como dizia Brecht, «do rio que tudo arrasta se diz que é violento; mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem». Pois é...

 

Breves notas açorianas

 
 

Tem sido objeto de bastante controvérsia a recente evolução política na Região Autónoma dos Açores e as suas ilações nacionais.

A aliança formalizada entre o PSD e o partido neofascista é, democraticamente, execrável. Sabemos que mesmo grande parte do Partido Popular Europeu, que o PSD integra, rejeita tal tipo de alianças mas, em Portugal, só se deve admirar quem desconheça a génese e a natureza  da direita lusa.

PSD, CDS, Chega e afins são filhos do mesmo capitalismo incompetente que, durante décadas, vegetou à sombra da União Nacional/ANP e sempre aplaudiu a repressão contra os trabalhadores e as suas organizações. As 'inquietações' democráticas só sobrevieram a alguns desses quando o fim do fascismo já era uma evidência ou, sobretudo, quando a revolução de Abril libertou a capacidade de intervenção de todos os portugueses.

As lideranças da direita (obviamente que  a maioria do seu eleitorado não tem essa compreensão) não diferem ideologicamente do salazarmarcelismo, apenas se têm procurado adequar, a contragosto,  ao 'jogo' democrático para defesa dos seus interesses. Há exceções, mas são apenas isso, exceções que ocasionalmente interessam à direita económica mas que nunca tiveram efetivo poder como, por exemplo, o percurso de Freitas do Amaral bem ilustrou.

A contribuição agora dada pela direita dita 'democrática' para promover o neofascismo merece repulsa e deve ser combatida.

Mas ficamos por aqui?

A "lição dos Açores" restringe-se à crítica à direita? A esquerda não deve refletir autocriticamente sobre o que levou a este desenlace?

O PS, depois de  uma prolongada governação, deu lugar a um Parlamento com a esquerda em minoria. Porquê?

Invocar a 'alternância democrática' ou o 'desgaste do poder' é escusa simplista que, mais não fosse, nem resistiria à comparação com a outra Região Autónoma.

Carlos César, primeiro, e Vasco Codeiro, depois, nunca quiseram corporizar uma verdadeira alternativa à governação da direita. A sua opção 'centrista' esteve sempre mais apostada numa 'evolução na continuidade', mantendo no essencial o mesmo rumo de Mota Amaral, sem significativas mudanças.

A precariedade, o cerceamento de direitos,  a desigualdade e o caciquismo  foram presenças constantes nos vinte anos de gestão PS nos Açores.  É verdade que houve alguns progressos neste período mas mais do que retirar à direita económica os seus instrumentos de  dominação o PS apostou em enfraquecer os Partidos à sua esquerda e em fragilizar as organizações locais dos trabalhadores.

Os factos açorianos ilustram as consequências de uma opção "socialista" que sonha com a 'alternância' e rejeita uma real alternativa. Um PS que se compraz em enfraquecer à sua esquerda e em teatralizar uma ilusória conflitualidade com a sua direita. Um PS que ainda vive na ambição de um bipartidarismo que possa garantir a tranquilidade do bloco central de interesses.

Não há como iludir que a atual emergência pública do neofascismo é também uma consequência da orientação 'centrista' que tem prevalecido no PS Açores.

Todos aqueles que se regozijam quando veem o PCP ou o BE a perder votos, todos quantos  denigrem a organização autónoma dos trabalhadores, todos quantos apostam na divisão e no enfraquecimento dos sindicatos, todos quantos querem o PS como um mero clube de eleitores prisioneiro do pântano centrista  deveriam aproveitar para refletir.

É também com essas opções que se alimenta o ascenso do fascismo. 

 

 

Astrazeneca e o que mais importa

  O "tema sensação" destes dias é o das vacinas. Trata-se de saber como é que estão, ou não estão, a ser distribuídas ? Questi...